terça-feira, 2 de junho de 2009

Saúde Receitas trancadas roubam remédios grátis a doentes

Desde ontem que os pensionistas com reformas inferiores ao salário mínimo podem ter genéricos gratuitos. No entanto, alguns clínicos receitaram medicamentos de marca e proibiram a substituição. Uma situação que o bastonário dos Médicos diz não o espantar.

Nos seus 82 anos, António Felipe cumpre um antigo ritual, subindo a Rua do Salitre, em Lisboa, para ir à Farmácia Nacional aviar uma pasta repleta de receitas. Mas, ontem, no dia em que entrou em vigor a comparticipação a 100% dos genéricos para os pensionistas com pensões abaixo do salário mínimo, António não pôde beneficiar da medida.

Apesar da pensão não ir além dos 399,66 euros - o que faz dele um beneficiário elegível -, a sua médica não prescreve genéricos para a grande maioria dos medicamentos que ele e a mulher necessitam. "Acho que a minha médica não me passa esses genéricos, pois não?", questiona, procurando a confirmação da farmacêutica. A directora adjunta da farmácia reitera que, de facto, "a médica tranca as receitas". Tal significa que o doente não pode beneficiar de uma medida que faz com que os pensionistas naquelas condições possam aceder de graça aos medicamentos para os quais existem genéricos. Em vez disso, António preparava-se para ali deixar mais de 150 euros. Mas, apesar de lhe custar gastar tanto, "tenho confiança na minha médica e ela é que sabe", diz.

Tal como António, e segundo constatou o DN junto de várias farmácias, muitos outros pensionistas não puderam ter genéricos gratuitos por os médicos terem bloqueado a receita.

Uma situação que para o secretário de Estado da Saúde, Francisco Ramos, faz parte das "regras do jogo", mas que deve ser alterada gradualmente. Já o bastonário dos Médicos diz que "é a confiança entre o médico e o doente que deve prevalecer" (Ver caixa).

O caso de António é comum ao de Leonor Santos, 71 anos, pensionista isenta, que ouviu as notícias na TV e espera ir aviar as receitas ali na Rua de São José. " Tenho várias para aviar, mas não sei se terei direito, porque é muito raro a médica passar-me medicamentos genéricos", lamenta Leonor, que paga mais de 100 euros mensais com medicamentos.

Casos idênticos são confirmados ao DN por vários farmacêuticos, que apontam uma variedade enorme de situações. "Há de tudo, desde o médico que não permite a troca pela substância activa, ao que deixa o critério ao doente e este prefere o medicamento de marca ao genérico", explica Ana Cristóvão, da Farmácia Grincho, na Parede, que ontem, até às 13.30, só tinha aviado quatro receitas grátis.

Apesar daquelas situações, o primeiro dia de vigência do custo zero para os pensionistas pobres, que pode abranger 1 milhão de pessoas, decorreu sem complicações, com a esmagadora maioria das farmácias preparadas do ponto de vista tecnológico. "Só até as 13 horas, aviámos 40 receitas a doentes que não pagaram nada", disse ao DN a directora técnica da Farmácia das Areias, em S.João do Estoril. Fernanda Pais explica que a actualização do software estava feita desde a meia-noite pelo Sifarma, um programa usado pelos associados da Associação Nacional das Farmácias (ANF) e que "assim que se colocam os dados do cartão de utente no computador, já aparecem os zeros no lugar do valor a pagar". A mesma sorte não teve Celeste Branco, 77 anos, que, por um erro da sua médica - que se esqueceu de indicar a situação de pensionista isenta na receita- , não beneficiou da gratuituidade do genérico para a hipertensão.

Nem todas as farmácias registaram adesão à novidade. É o caso da farmácia Morais Sarmento, cuja proprietária, disse não ter atendido até meio da tarde um único pensionista naquelas condições. "A maior afluência é por volta dos dias 20 e 22 de cada mês, que é quando recebem as pensões", explicou Helena Pedro.


por CARLA AGUIARHoje DN

4 comentários:

  1. Não há bela sem senão...Tinham que chegar uns certos chicos espertos para boicotar tudo.

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  2. Esquecimento dos médicos em passar genéricos? Será?
    Mas será mesmo?
    Aqueles ditos congressos e viagens sabem tão bem de vez em quando....
    Mss, graças a Deus, há sempre de tudo em cada profissão...

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  3. Por aqui, a nossa médica de família não tem trancado as receitas.

    Nem todos são "bestas"...

    Olinda

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  4. Maria, é assim...ai da minha médica de família que ousasse sequer recusar-se a passar-me genéricos só porque não lhe apetece...ou porque se esqueceu...afinal quem lhes paga o ordenado ao fim do mês? Não somos nós todos? Ou serão apenas os delegados de propaganda médica? Mas quando vão pensionistas, já com uma certa idade, que até se interrogam se a médica ou o médico naquele dia estará de bom humor (como eu já assisti) e que não têm a força suficiente para fazerem valer os seus direitos se o mau humor até persiste...coitadinhos, nao é?

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